sexta-feira, 7 de outubro de 2016

Quando eles se tornam pequenos adultos

(from Flukkie, DeviantArt)

Se há coisa que me entristece, é ver crianças transformarem a sua maneira de ser e terem toda a sua existência construída como se fossem adultos. Infelizmente, já por várias vezes conheci crianças-adultos. São aquelas crianças que têm uma noção apuradíssima do dinheiro (e na maioria dos casos, da falta dele). São aquelas crianças que deixaram de ter como tarefa matinal preguiçarem enquanto se vestem. Não podem. Não podem porque têm a obrigação ingrata de ir acordar os pais, ou de preparem sozinhas o pequeno-almoço. Em casos extremos, têm (imagine-se) a preocupação medonha de ter de tirar dinheiro aos pais para poderem comer. São crianças que sabem melhor o horário da escola do que os pais e como se isso não lhes bastasse, também sabem o horário dos empregos dos pais. Fazem de adultos. "Vá lá pai, acorda." e o adulto é que se espreguiça entre lençóis.

E às vezes, por muito bem que os pais tratem destas crianças-adulto, e sejam pais que fazem todos os sacrifícios do mundo para que elas sejam felizes e nada lhes falte, elas tornaram-se assim por obrigação moral para com quem vivem. Sentem que em casa não há dinheiro suficiente. Sabem que não podem fazer parte da equipa de futebol da cidade porque o "dinheiro não nasce nas árvores." Têm uma noção clara da infindável lista de preocupações dos pais. Às vezes basta que vivam só com a mãe ou só com pai, para se transformarem sem querer em crianças-adulto. Tomam as dores dos pais. Os medos. De repente, em vez de terem medo de não serem escolhidos no intervalo para um jogo, têm medo da conta de electricidade que falta pagar. E repetem para quem as quiser ouvir, do dinheiro que não têm.

E, como crianças-adulto, observam como adultos. Sabem o que se passa e da forma que se passa.

Porque também as há. As crianças-adulto silenciosas. Estudam o ambiente. Raciocinam. Chegam ao ponto de, quando um colega lhes diz: "pede à tua mãe para te comprar", responder: "ela gasta sempre tudo em cigarros..."

Engane-se quem julga que as crianças, por serem crianças, não entendem, não compreendem, escapasse-lhes  um conjunto de detalhes.

Sim, é verdade que muitos detalhes escapam à atenção das crianças mas os importantes, do dia-à-dia, raramente escapam.

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