(from WGSN)
Nas últimas duas décadas, tenho ouvido de vários colegas de profissão vários casos de pais que lhes dizem, muito preocupados, que os filhos se queixam que não gostam nem da escola, nem do ATL.
Na cabeça de um pai ou de uma mãe, quando o filho diz que não gosta da escola nem do ATL, surgem logo em cascata como motivos:
- os outros colegas não estão a ser bons amigos e deixam-no à parte
- a escola e o ATL não fazem atividades suficientemente divertidas
Muitas vezes, acontece uma criança não gostar da escola por vários motivos importantes de perceber:
- às vezes a criança sente-se insegura perante alguns colegas mais velhos ou mais mandões, que passam os intervalos a amedrontar os mais novos
- às vezes a criança sente-se frágil e insegura porque teve um irmão e sabe que a mãe ou o pai está em casa a dar toda a atenção do mundo ao bebé
- às vezes a criança não tem muitos amigos na escola e por isso, as horas de recreio são mais difíceis
- às vezes a criança está muito ligada à mãe ou ao pai porque um deles ficou desempregado pelo que o tempo que passam juntos é muito superior, pelo que se gera ali uma maior dependência emocional
- às vezes a criança está a passar por uma fase em casa diferente do habitual (os pais vão-se separar, a avó morreu, vão mudar de casa, a tia está doente, etc) e isso faz com que a criança esteja preocupada e sinta necessidade de estar mais em casa, para tentar saber o que vai acontecer e como vai acontecer (as crianças precisam de lógica para se sentirem seguras)
- às vezes a criança esteve doente durante vários dias e faltou às aulas: quando volta, novos grupos de amizade foram formados nos intervalos e a criança sente-se mais isolada
Quando se percebe que a criança não gosta da escola ou do ATL como um todo e que estar naquele espaço é difícil para a criança, é muito importante que a criança tenha o apoio dos pais, professor e até de um psicólogo, para se estudar a fundo os tais motivos mais escondidos que mencionei acima. Se esses problemas forem abordados na maneira certa, a criança com o tempo retoma o gosto pela escola e começa lentamente a sentir-se melhor naquele espaço.
Porém, há casos de alunos que dizem que não gostam da escola como quem cospe para o chão. Não gostam da escola e pronto! "Não gostam de fazer contas". E de escrever? "Também não". E dos trabalhos de inverno e da páscoa? "Nem pensar."
Não gostam de nada. Não gostam da cor das paredes da sala de aula. Não gostam da biblioteca, não gostam de ler, não gostam de trabalhos de casa, não gostam de testes e corrigir exercícios que erraram, esses, odeiam!
Estas são as crianças que na escola, só gostam de uma única coisa: do recreio. Estas são as crianças que não gostam de se esforçar. Não gostam, não querem e têm raiva de quem gosta e quer.
Por isso, estas são as crianças que em turma dizem com muita convicção que "ninguém gosta da escola, estudar é uma seca!"
Só que (e é isto que me preocupa tanto...) estas crianças não se lembraram um dia de dizer que não gostam da escola só porque sim. Não. Estas são as crianças que no primeiro ano, se deslumbravam com o que aprendiam. São as crianças que se divertiam na escola... São as crianças que, por algum motivo, perceberam no seu crescimento que não tinham de se esforçar. São crianças que perceberam que esforçarmo-nos exige muito de nós e elas já não estão para isso. Elas são felizes sem se esforçarem porque continuam a ouvir que são é incompreendidas. São as crianças que quer se esforcem quer não, recebem recompensas. A vida é-lhes sempre igual. Recebem sempre mesmo. Não lhes é exigido mais nem menos. No fundo, se formos analisar com mais profundidade, os pais até podem ter boa intenção, achando que não estão a ser exigentes em demasia, mas para as crianças, elas retiram disto que: tanto faz.
É um pouco como sermos contratados para lavar um metro quadrado de chão. No primeiro dia lavamos o metro quadrado com imenso esforço e deixamo-lo a brilhar. O nosso patrão fica satisfeito. No dia seguinte lavamos com menos esforço, ainda assim ficou lavado. O nosso patrão fica satisfeito. Passados uns dias, não estamos com espírito para lavar chão, passamos só uma vez só para tirar a maior e não dizerem que não lavámos. O nosso patrão fica satisfeito. Eventualmente, perguntamo-nos: que importa esforçar-me mais, se para ele, é tudo igual?
Para nós, como adultos, importa: percebemos que lavar o metro quadrado bem, faz de nós pessoas responsáveis, competentes e úteis... E por conseguinte, isso faz-nos sentir bem connosco próprios.
Mas para uma criança? Uma criança ainda está a perceber como é que o mundo funciona.
Para estas crianças, tanto faz fazer os trabalhos de casa bem. Tanto faz fazer as contas. Tanto faz pintar isto bem. Tanto faz aprender ou não aprender a multiplicação. Tanto faz fazer o presente do dia do pai. Tanto faz ir ou não na visita de estudo.
Este tanto faz, muitas vezes, encobre a carência que têm de uma mudança de atitude. Às vezes é só isso mesmo. Uma chamada de atenção aos pais. Por vezes, tudo o que precisam é que os pais lhes digam: antigamente estavas a conseguir fazer as contas tão bem, o que se passa? Precisas de ajuda? No intervalo hoje jogaste ao quê? Com quem? Então o teu amigo Rodrigo sempre chamou Rex ao cão novo? Por vezes, tudo o que precisam é de motivação: que os pais lhes digam o quanto a escola é importante e os incentivem: "vais ver que para a semana vais gostar muito mais da escola, eu costumava gostar quando fazíamos composições e depois jogávamos ao rei manda no intervalo".
E quando as crianças não querem mesmo mesmo fazer o mínimo esforço e amuam sempre que têm de escrever uma composição ou calcular uma soma, é porque sentem que trabalhando ou não, são recompensadas. É por isso fundamental que os pais, em casa, ponderem que tipo de recompensas estão a dar na ausência de esforços e arranjem motivação extra para o trabalho: "se a próxima ficha de matemática te correr melhor, no fim-de-semana vamos ao cinema ver aquele filme que deve ser o máximo."
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